Tem gente que espera uma casa própria para pensar em engravidar. Ou a estabilidade financeira. Ou o amor da vida. Ou fazer uma viagem pra Europa.
A verdade é que se você ficar esperando alguma coisa mudar ou se estabilizar na sua vida para ter filho, você não tem. Quem racionaliza não tem filho: o mundo é péssimo, violento, hipócrita, corrupto e sem imaginação. Ter filho é caro, criar uma criança exige tempo e dedicação. Talvez você leia menos livros, talvez nunca aprenda a falar alemão, talvez nunca alcance uma barriga de tanquinho, ou consiga aquele carro esportivo. Ou seja, pra que, né?
Eu ainda não consegui essa resposta, eu só senti que era a hora de ter um filho. Assim. Eu tive fases de querer ter filho, tive fases de achar que não suportaria a idéia de ter cabelos dentro de mim, unhas. Mas aí meu vô morreu e eu fiquei com essa sensacão de finitude mal elaborada e sempre pensava que talvez, se eu tivesse um filho, a vida voltasse a acontecer com mais força do que a morte, pelo menos na minha realidade.
Não teve nada de racional. eu tô organizando para contar. Foram ondas, uma sensação. Tomar a pílula ficava cada vez mais idiota e sem sentido. Um dia minha menstruação acabou. E eu não fui à farmácia.
Eu não tinha menor intenção de engravidar tão rápido quanto eu engravidei. Mas foi assim. Parei a pílula e engravidei bem rápido, mesmo tendo ovários policísticos, mesmo viajando duas semanas por mês sem ver o maridón, mesmo com o ciclo irregular. E então estamos aí, encarando o mistério que é ter uma pessoa dentro de você.
Pois é isso, um mistério. Não adianta racionalizar o troço. Lógico que você pode lembrar dos aspectos científicos: zigotos, gametas. X, Y. Seus tecidos e células virando tecidos e células de outra pessoa. Mas isso não explica nada, nem o porquê de ter um filho, nem como fazer isso: ser mãe.
Eu nunca achei que só me realizaria como mulher se tivesse filho, que só me sentiria completa como mãe. Pra mim isso é bobagem. Mulher é mulher, nos reinventamos, nos construímos como mulheres independente da maternidade. Mas é inegável que existe uma trasmutação do que é ser, de que lugar se ocupa no mundo e da maneira que vamos atravessar a vida daqui pra frente.
O lance é aceitar, receber isso. Abraçar isso. Afundar a cara nisso e viver isso da forma mais intensa e profunda que der. Pois se explicar não dá, pelo menos dá pra sentir, e sentir tudo: medo, dor, amor, raiva, alegria, plenitude.
Não dá pra ficar na beirinha dessa experiência, só molhando os pés. É tempo de mergulhar.
::
Quando eu era adolescente tinha um sonho recorrente onde eu ficava presa em uma caverna cheia de água. Afundada, sem ar, tentava achar uma saída e a saída era sempre uma outra caverna, ainda mais bonita, mas ainda mais profunda e assustadora que a anterior. Eu sempre pensava que o ar ia faltar, mas surpresa, o ar não faltava. E eu ia. Eu continuava. Afundada no azul. Essa semana eu sonhei de novo, depois de anos. E eu consegui sair, voltar e transitar livremente, nadando entre todas as galerias, sem medo. Foi bom.
Eu não sei se eu sou boba, mas esse texto me emocionou. Mudou muita coisa em mim. Obrigada.
ResponderExcluirNhóm. Love you.
ResponderExcluir